domingo, 31 de maio de 2009

Ama e faz o que quiseres. Se calares, calarás com amor; se gritares, gritarás com amor; se corrigires, corrigirás com amor; se perdoares, perdoarás com amor. Se tiveres o amor enraizado em ti, nenhuma coisa senão o amor serão os teus frutos.


Santo Agostinho

sábado, 30 de maio de 2009

Porto,



Quando ele chegar trazendo em seus olhos
meu porto
baixarei as velas na manhã
e no claro dia de minha alma
colocarei meu corpo ao seu lado
sem amarras, sem âncora
pois que nele só poderei chegar
nunca partir.

Poema: Regina Vilarinhos
Fotografia: Carolina Sá

domingo, 24 de maio de 2009

Domingo Mudo *

Sentimentos trancados.
Palavras mudas.

sábado, 16 de maio de 2009

O tempo que nos resta

De súbito sabemos que é já tarde. Quando a luz se faz outra, quando os ramos da árvore que somos soltam folhas e o sangue que tínhamos não arde como ardia, sabemos que viemos e que vamos. Que não será aqui a nossa festa. De súbito chegamos a saber que andávamos sozinhos. De súbito vemos sem sombra alguma que não existe aquilo em que nos apoiávamos. A solidão deixou de ser um nome apenas. Tocamo-la, empurra-nos e agride-nos. Dói. Dói tanto! E parece-nos que há um mundo inteiro a gritar de dor, e que à nossa volta quase todos sofrem e são sós. Temos de ter, necessariamente, uma alma. Se não, onde se alojaria este frio que não está no corpo? Rimos e sabemos que não é verdade. Falamos e sabemos que não somos nós quem fala. Já não acreditamos naquilo que todos dizem. Os jornais caem-nos das mãos. Sabemos que aquilo que todos fazem conduz ao vazio que todos têm. Poderíamos continuar adormecidos, distraídos, entretidos. Como os outros. Mas naquele momento vemos com clareza que tudo terá de ser diferente. Que teremos de fazer qualquer coisa semelhante a levantarmo-nos de um charco. Qualquer coisa como empreender uma viagem até ao castelo distante onde temos uma herança de nobreza a receber. O tempo que nos resta é de aventura. E temos de andar depressa. Não sabemos se esse tempo que ainda temos é bastante. E de súbito descobrimos que temos de escolher aquilo que antes havíamos desprezado. Há uma imensa fome de verdade a gritar sem ruído, uma vontade grande de não mais ter medo, o reconhecimento de que é preciso baixar a fronte e pedir ajuda. E perguntar o caminho. Ficamos a saber que pouco se aproveita de tudo o que fizemos, de tudo o que nos deram, de tudo o que conseguimos. E há um poema, que devíamos ter dito e não dissemos, a morder a recordação dos nossos gestos. As mãos, vazias, tristemente caídas ao longo do corpo. Mãos talvez sujas. Sujas talvez de dores alheias. E o fundo de nós vomita para diante do nosso olhar aquelas coisas que fizemos e tínhamos tentado esquecer. São, algumas delas, figuras monstruosas, muito negras, que se agitam numa dança animalesca. Não as queremos, mas estão cá dentro. São obra nossa. Detestarmo-nos a nós mesmos é bastante mais fácil do que parece, mas sabemos que também isso é um ponto da viagem e que não nos podemos deter aí. Agora o tempo que nos resta deve ser povoado de espingardas. Lutar contra nós mesmos era o que devíamos ter aprendido desde o início. Todo o tempo deve ser agora de coragem. De combate. Os nossos direitos, o conforto e a segurança? Deixem-nos rir... Já não caímos nisso! Doravante o tempo é de buscar deveres dos bons. De complicar a vida. De dar até que comece a doer-nos. E, depois, continuar até que doa mais. Até que doa tudo. Não queremos perder nem mais uma gota de alegria, nem mais um fio de sol na alma, nem mais um instante do tempo que nos resta.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Quem de nós dois

Eu e você
Não é assim tão complicado
Não é difícil perceber...
Quem de nós dois
Vai dizer que é impossível
O amor acontecer...


Se eu disser
Que já nem sinto nada
Que a estrada sem você
É mais segura
Eu sei você vai rir
Da minha cara
Eu já conheço o teu sorriso
Leio o teu olhar
Teu sorriso é só disfarce
E eu já nem preciso...


(...)


E cada vez que eu fujo, eu me aproximo mais
E te perder de vista assim é ruim demais
E é por isso que atravesso o teu futuro
E faço das lembranças um lugar seguro...
Não é que eu queira reviver nenhum passado
Nem revirar um sentimento revirado
Mas toda vez que eu procuro uma saída
Acabo entrando sem querer na tua vida


Eu procurei qualquer desculpa pra não te encarar
Pra não dizer de novo e sempre a mesma coisa
Falar só por falar
Que eu já não tô nem aí pra essa conversa
Que a história de nós dois não me interessa...


(...)

Ana Carolina

sábado, 9 de maio de 2009


Chuva e Trovoada. Coração quente. Há tardes assim.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade
É servir a quem vence o vencedor,
É ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade;
Se tão contrário a si é o mesmo amor?




domingo, 3 de maio de 2009

a nostalgia apoderou-se de mim

Amámo-nos outrora, claro que amámos. Mas depois acabou, como quase todas as amizades de infância acabam um dia. Não importa quem tinha feito o quê, não se tratava de culpa nem remorso. Tratava-se de crescer. (...) Acabou e eu sinto-me subitamente imponderável, voando sobre mim mesma, tão leve e despreocupada como as nuvens. Olho para o céu através dos pinheiros, quase esperando um sinal, e com um repentino clarão prateado, o sol surge por detrás do tronco de uma árvore, a luz ressaltando dos remendos de neve e ofuscando-me por um momento. Agora chega a realidade. Andei, durante todo este tempo, desesperadamente perdida, mas agora as viagens e a espera chegaram ao fim.
( Katy Gardner - Viagem Sem Regresso )


Não vou dizer que tenho saudades tuas - habituei-me a tua ausência. Tal como tu, te habituas-te a nossa distância. Mas as minhas memórias antigas - que se encontravam já adormecidas - acordaram. Consequentemente, lembrei-me de ti. De certa forma, por causa deste livro que me ocupou a mente nestes três longos dias. Um sentimento de nostalgia apoderou-se de mim.
Acompanhaste de perto, toda a minha infância e por parte, a minha adolescência. Quando chegámos aos 15 anos, aquilo que nos mantinha unidas, afastou-nos por completo. Eu que sempre me culpei, e tu, que me culpaste também pelo nosso afastamento. E na verdade, não foi culpa de ninguém. Desde pequenas, sempre fomos diferentes. Era isso que nos completava. Era por este motivo, que éramos inseparavéis. E o fomos durante 10 anos longos anos. Tu eras tudo o que eu não era. Eu era alta e magra, sardenta de cabelos encaracolados. Tu, tinhas o cabelo curto e preto liso, e sempre foste baixinha e redonda - Lembro-me de quando disseste: Já tenho 1,55 sabem? Para ti, crescer meio centímetro sempre foi uma grande vitória. Tinhas uma personalidade forte. Não te deixavas pisar. Tinhas garra, e defendias o que era teu com unhas e dentes. Muitas vezes defendeste-me, em diversas situações. Porque eu ao contrário de ti, era sensível e ingénua. Vivia num mundo cor de rosa, e sempre tentei mostrar-me indiferente a provocações (mas era no teu ombro que eu me lamentava ), deixava que me pisassem. Achava que o melhor era ignorar, pensava que assim conseguia mostrar a minha força. Sempre fui paciente, achava que tudo um dia se pagava, de uma forma ou de outra. Tu eras impaciente, se fosse necessário davas na tromba, a quem se metesse no teu , ou no meu caminho. Mas a verdade, é que sempre foste de birras, amuavas por tudo e por nada. Talvez fosse para chamares atenção, sempre gostaste de estar no centro do mundo - mas as birras eram tantas, que já ninguém dava importância. Foste sempre explosiva, a rapariga alegre do nosso bairro. E eu, a querida e adorada por todos. Quando estávamos juntas, conseguíamos encontrar um equilíbrio. Estávamos sempre em harmonia. Em dez anos chateámos-nos uma única vez. Com o tempo, mudaram-se os gostos, mudaram-se os interesses, mudaram-se as vidas. E acabámos por seguir caminhos diferentes. Não sei se evoluímos, mas a verdade é que transformámo-nos. Crescemos? Eu já não sou quem conheceste em tempos, e tu já não és quem eu conheci à doze anos atrás. Já não vivemos no Vale das Rosas, no bairro na periferia, onde pensávamos que tudo era perfeito. Um mundo feliz, e ingénuo longe de tudo aquilo que nos poderia fazer crescer. Quando abandonei esse lugar, enterrei uma parte de mim. Custou-me cortar as minhas raízes, afinal de conta, tinha crescido aí. Demorei um ano a habituar-me à ideia. Mas hoje, penso de uma maneira diferente sabes? Se continuasse a viver aí, talvez ainda fossemos amigas, mas nunca me tinha tornado a pessoa que sou hoje - ia continuar com a minha mente condicionada. Aprendi muito a observar outras realidades, também aprendi com as minhas vitórias, com os-porta-na-cara e principalmente com os meus erros, e algumas lágrimas. E isto que faz parte da vida. É assim que me sinto viva. E por mais que me tenha custado o trajecto até aqui, eu gosto de quem sou hoje. E de certa forma, devo-to a ti, também.
Não fomos culpadas de nada. Crescer, e escolher caminhos faz parte da vida. Quero que saibas, que guardo todos os nossos momentos, e guardo-te a ti também. No coração.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Lado esquerdo do peito

"Quando um coração se fecha, faz muito mais barulho do que uma porta. (...)
Levar com a porta na cara dói muito. Dói sempre, o dia inteiro, a todas as horas e a todos os minutos. Dói tanto que os segundos se podem tornar insuportáveis e os dias facilmente se transformam em epopeias, viagens trágico-maritimas. Dói de manhã, assim que regressamos do abençoado estado de inconsciência em que o sono nos guarda, quando olhamos para o lado e perguntamos: e agora?
(...) Dói quando nos lavamos, quando comemos, quando engolimos, quando respiramos, quando falamos, quando ouvimos, quando pensamos. Dói um bocadinho menos quando os amigos nos abraçam. Mas o que mais dói é saber que alguém que ainda amamos, por medo e por sofrimento, nos fechou o coração. O som é igual ao de mil tambores em fúria: não vale a pena falar, não vale a pena escrever, não vale a pena tentar chegar ao outro lado, saltar o muro, enviar emissários, içar bandeiras, fazer cimeiras, apanhar aviões e levar o nosso coração como presente porque ele já não o quer. Quando o outro coração se fecha, deixa de ser nosso. E quando um homem fica surdo do coração, como é muito mais prático do que uma mulher, em vez de chorar e lamber as feridas, oferece-o a outra mulher. Os homens têm uma existência infinitamente mais leve; confundem desejo com amor."

Margarida Rebelo Pinto