domingo, 3 de maio de 2009

a nostalgia apoderou-se de mim

Amámo-nos outrora, claro que amámos. Mas depois acabou, como quase todas as amizades de infância acabam um dia. Não importa quem tinha feito o quê, não se tratava de culpa nem remorso. Tratava-se de crescer. (...) Acabou e eu sinto-me subitamente imponderável, voando sobre mim mesma, tão leve e despreocupada como as nuvens. Olho para o céu através dos pinheiros, quase esperando um sinal, e com um repentino clarão prateado, o sol surge por detrás do tronco de uma árvore, a luz ressaltando dos remendos de neve e ofuscando-me por um momento. Agora chega a realidade. Andei, durante todo este tempo, desesperadamente perdida, mas agora as viagens e a espera chegaram ao fim.
( Katy Gardner - Viagem Sem Regresso )


Não vou dizer que tenho saudades tuas - habituei-me a tua ausência. Tal como tu, te habituas-te a nossa distância. Mas as minhas memórias antigas - que se encontravam já adormecidas - acordaram. Consequentemente, lembrei-me de ti. De certa forma, por causa deste livro que me ocupou a mente nestes três longos dias. Um sentimento de nostalgia apoderou-se de mim.
Acompanhaste de perto, toda a minha infância e por parte, a minha adolescência. Quando chegámos aos 15 anos, aquilo que nos mantinha unidas, afastou-nos por completo. Eu que sempre me culpei, e tu, que me culpaste também pelo nosso afastamento. E na verdade, não foi culpa de ninguém. Desde pequenas, sempre fomos diferentes. Era isso que nos completava. Era por este motivo, que éramos inseparavéis. E o fomos durante 10 anos longos anos. Tu eras tudo o que eu não era. Eu era alta e magra, sardenta de cabelos encaracolados. Tu, tinhas o cabelo curto e preto liso, e sempre foste baixinha e redonda - Lembro-me de quando disseste: Já tenho 1,55 sabem? Para ti, crescer meio centímetro sempre foi uma grande vitória. Tinhas uma personalidade forte. Não te deixavas pisar. Tinhas garra, e defendias o que era teu com unhas e dentes. Muitas vezes defendeste-me, em diversas situações. Porque eu ao contrário de ti, era sensível e ingénua. Vivia num mundo cor de rosa, e sempre tentei mostrar-me indiferente a provocações (mas era no teu ombro que eu me lamentava ), deixava que me pisassem. Achava que o melhor era ignorar, pensava que assim conseguia mostrar a minha força. Sempre fui paciente, achava que tudo um dia se pagava, de uma forma ou de outra. Tu eras impaciente, se fosse necessário davas na tromba, a quem se metesse no teu , ou no meu caminho. Mas a verdade, é que sempre foste de birras, amuavas por tudo e por nada. Talvez fosse para chamares atenção, sempre gostaste de estar no centro do mundo - mas as birras eram tantas, que já ninguém dava importância. Foste sempre explosiva, a rapariga alegre do nosso bairro. E eu, a querida e adorada por todos. Quando estávamos juntas, conseguíamos encontrar um equilíbrio. Estávamos sempre em harmonia. Em dez anos chateámos-nos uma única vez. Com o tempo, mudaram-se os gostos, mudaram-se os interesses, mudaram-se as vidas. E acabámos por seguir caminhos diferentes. Não sei se evoluímos, mas a verdade é que transformámo-nos. Crescemos? Eu já não sou quem conheceste em tempos, e tu já não és quem eu conheci à doze anos atrás. Já não vivemos no Vale das Rosas, no bairro na periferia, onde pensávamos que tudo era perfeito. Um mundo feliz, e ingénuo longe de tudo aquilo que nos poderia fazer crescer. Quando abandonei esse lugar, enterrei uma parte de mim. Custou-me cortar as minhas raízes, afinal de conta, tinha crescido aí. Demorei um ano a habituar-me à ideia. Mas hoje, penso de uma maneira diferente sabes? Se continuasse a viver aí, talvez ainda fossemos amigas, mas nunca me tinha tornado a pessoa que sou hoje - ia continuar com a minha mente condicionada. Aprendi muito a observar outras realidades, também aprendi com as minhas vitórias, com os-porta-na-cara e principalmente com os meus erros, e algumas lágrimas. E isto que faz parte da vida. É assim que me sinto viva. E por mais que me tenha custado o trajecto até aqui, eu gosto de quem sou hoje. E de certa forma, devo-to a ti, também.
Não fomos culpadas de nada. Crescer, e escolher caminhos faz parte da vida. Quero que saibas, que guardo todos os nossos momentos, e guardo-te a ti também. No coração.

Sem comentários:

Enviar um comentário